Dica de segurança

willian
2 min readAug 19, 2023

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Não sei o que acontece, mas aqui no bairro sempre tem uma escada escorada em um poste, no meio da calçada. Às vezes é uma manutenção no cabeamento elétrico, às vezes uma poda de árvore. Não importa. Minha conduta é sempre igual: eu dou a volta. Não passo em baixo. É apenas uma questão lógica, de segurança, não por crendice. A superstição me pega mesmo quando conheço uma pessoa nova.

Meu coração é mole. Uma fala mansa já se derrete todo. Ainda assim, apesar dessa benevolência toda, não preciso ver muito para um julgamento perfeito de caráter. Em menos um segundo consigo saber a índole da pessoa. Nenhuma pose passa despercebida pelos diversos MIPS instalados diretamente na minha cabeça. Quem é de verdade sabe quem é de mentira.

Uma vez, em um churrasco de formatura, conheci uma camarada. Eu nunca vi a sujeita antes, porém esbarrei com ela umas três vezes dentro de uma semana. A primeira, no churrasco, troquei ideia. Afinal, amiga do amigo é, pelo menos, conhecida. A segunda, me esforcei para cumprimentar. A terceira, eu fingi que nem vi.

Minha técnica é muito simples. Em um olhar apenas, milhões de sinapses disparam no meu cérebro e classificam o indivíduo em uma das três categorias: Gente fina, mau-caráter e me apaixonei.

As duas primeiras são, obviamente, excludentes entre si. É importante saber quem tá pra somar e quem tá pra subtrair. Nesse aspecto, eu nunca errei. Não sei explicar como, mas nunca cai em golpes, armadilhas, mutretas, esquema de pirâmide, tarot, casino online, nacionalismo ou consórcio. Porém, como nada é de graça, dessa habilidade de leitura perfeita da realidade é que vem a minha capacidade de me apaixonar.

A paixão sempre é a opção dominante. Se essa for minha conclusão, as outras não são relevantes. Caráter é o que menos importa quando a ansiedade ataca, o coração bate mais rápido, as pernas ficam bambas, o ar diminui, o teto preto, o processador da NASA curto circuita e as palavras fogem. Essas são as pistas para já começar o planejamento do casamento. Tudo isso passa pela minha cabeça em um instante, acredita?

Outro dia um amigo meu me manda uma foto e pergunta:

— Você conhece essa pessoa?

Era ela. A menina do churrasco. Na foto ela estava mais bonita. Não sei como ele descobriu que eu sabia da existência dela.

— Pede pra ela parar de ser cuzona.

Ele começou em um emprego e ela era quem treinava os novatos. Claramente ela não queria ajudar ninguém, muito menos calouros. Combina muito com a pessoa que conheci.

— Também não vou com a cara dela. — respondi infalível.

Enfim, meu ponto é que nada vem de bom se você passar embaixo de uma escada. Talvez o azar da crença popular seja um martelo na caindo sua cabeça. Dê a volta sempre. Tome cuidado.

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