Pra qualquer canto se olha pela internet existe um anúncio de casa de apostas. Dobramos seu dinheiro no primeiro depósito. Odds imperdíveis no jogo do Palmeiras contra o Água Santa pela final do paulista. Quantos gols do Cano faz Vítor Pereira cair do comando do Flamengo? Nada disso me convence, pois minha mãe me proibiu de apostar.
Eu não tinha nem dez anos quando um amigo mais velho falou que conseguia fazer um 180 graus derrapando na minha bicicleta. Falei duvido. Ele falou aposta? Sim. Um real? Não, dois e cinquenta.
Eu não sabia o que era derrapar, 180 graus e muito menos o que era uma aposta.
Do lado da padaria dos pais dele tinha uma entrada sem muro que dava para os fundos. Tinha a largura suficiente para entrar um carro, e comprimento suficiente para uma bicicleta ir de zero a cem em poucos segundos. Ele subiu na bicicleta já projetando o corpo pra frente, impulsionando tanto que o camelinho branco tremia. Jogou o corpo pro lado, apertou o freio e a bicicleta girou mais que o suficiente. Aquele C no chão deixava o registro que devia dinheiro à alguém pela primeira vez na vida.
Sem renda nenhuma, tive que pedir o dinheiro pra minha mãe. Ela me deu, e como estava de bom humor, ganhei também um embargo permanente na jogatina.
Nessa mesma época comecei o hábito de colecionar. Tenho até hoje os cartões telefônicos que ganhei da minha avó. Porém, eu era fanático mesmo pelos os brindes que vinham nos pacotes de chips.
A época dos tazos do looney tunes e do maskara já tinha passado. Aproveitando o sucesso de pokémon, começaram cartinhas de poder do desenho. Como eu era maluco pelo anime, colecionei. Logo depois, vieram tazos, não poderia deixar passar. Com uma nova temporada eles lançaram uma coleção com o tema de jo-ken-po. Já não estava mais tão entusiasmado assim, não fiz muito esforço em começar acumular.
Como bom apreciador de Fandangos, eventualmente ganhei uma cartinha. Sem saber o que fazer com ela, coloquei no bafo à vera. O destino iria decidir.
As cadeiras de concreto em frente a sala da diretora da escola era a área designada. Um lugar escuro, sem janelas. A pressão do jogo me afetou e eu tremia. Sentamos no chão. Ganhei no par ou ímpar. Ajeitei as cartas, bati e não virei. Fudeu. Bernardo, que me escolheu como oponente, confiante, bateu forte, mas sem técnica. As cartas pularam, mas não viraram.
Eu sabia jogar. Tinha habilidade. E na segunda tentativa, mesmo com a mão instável, virei as duas e o alívio veio. Naquele dia a sorte estava do meu lado.
Ele me pediu uma revanche. Neguei. Saí de lá orgulhoso, com a segunda carta da mais nova coleção e decidido a nunca mais desobedecer minha mãe.
